História da Redenção

Capítulo 39

O ministério de Pedro

[Flash Player]

Este capítulo é baseado em Atos dos Apóstolos 9:32-11:18.

Pedro, na promoção de seu trabalho, visitou os santos em Lida. Ali curou Enéias, que durante oito anos estivera de cama, com paralisia. “Disse-lhe Pedro: Enéias, Jesus Cristo te cura! Levanta-te e arruma o teu leito. Ele imediatamente se levantou. Viram-no todos os habitantes de Lida e Sarona, os quais se converteram ao Senhor.”

Em Jope, que era perto de Lida, a este tempo Tabita — chamada Dorcas por interpretação — jazia morta. Tinha sido uma digna discípula de Jesus Cristo, e sua vida caracterizada por atos de caridade e bondade para com os pobres e sofredores e pelo zelo na causa da verdade. Sua morte foi uma grande perda; a igreja infante não podia dispensar seus nobres esforços. Quando os crentes ouviram das curas maravilhosas operadas por Pedro em Lida, desejaram grandemente que ele viesse a Jope. Mensageiros foram a ele enviados, solicitando sua presença ali.

“Pedro atendeu e foi com eles. Tendo chegado, conduziram-no para o cenáculo; e todas as viúvas o cercaram, chorando e mostrandolhe túnicas e vestidos que Dorcas fizera enquanto estava com elas.” Pedro determinou que os amigos em pranto se retirassem do quarto. Então ajoelhou-se e orou fervorosamente a Deus para que restituísse vida e saúde ao corpo inanimado de Dorcas; “e voltando-se para o corpo, disse: Tabita, levanta-te. Ela abriu os olhos e, vendo a Pedro, sentou-se. Ele, dando-lhe a mão, levantou-a; e chamando os santos, especialmente as viúvas, apresentou-a viva”. Esta grande obra de ressuscitar um morto à vida foi o meio de converter muitos em Jope para a fé em Jesus.

O centurião

“Morava em Cesaréia um homem, de nome Cornélio, centurião da coorte, chamada a italiana, piedoso e temente a Deus com toda a sua casa, e que fazia muitas esmolas ao povo e de contínuo orava a Deus.” Embora Cornélio fosse romano, ele se tornara familiarizado com o verdadeiro Deus e renunciara a idolatria. Era obediente à vontade de Deus e O adorava com sincero coração. Não se havia associado com os judeus, porém reconhecia e obedecia à lei moral. Não havia sido circuncidado, nem tomado parte no sistema sacrifical, era portanto tido pelos judeus como imundo. Ele, contudo, sustentava a causa judaica por liberais doações, sendo conhecido longe e perto por seus atos de caridade e beneficência. Sua vida justa o fizera gozar boa reputação tanto entre judeus, como gentios.

Cornélio não tinha uma fé inteligente em Cristo, embora cresse nas profecias e estivesse aguardando o Messias por vir. Mediante seu amor e obediência a Deus, foi trazido para perto dEle, e preparado para receber o Salvador quando Ele lhe fosse revelado. A condenação vem pela rejeição da luz concedida. O centurião era um homem de nobre estirpe e ocupava uma posição de elevada confiança e honra; mas estas circunstâncias não lograram subverter os nobres atributos de seu caráter. A verdadeira bondade e a grandeza unidas fizeram dele um homem de dignidade moral. Sua influência era benéfica para todos com os quais entrava em contato.

Cria no único Deus, Criador dos Céus e da Terra. Ele O reverenciava, reconhecia Sua autoridade e procurava Seu conselho em todos os negócios da vida. Era fiel em seus deveres domésticos, bem como em suas responsabilidades oficiais, e erigira um altar a Deus em seu lar. Não ousava efetuar seus planos e suportar o fardo de suas pesa- das responsabilidades, sem a ajuda de Deus; por isso orava bastante e fervorosamente por esta ajuda. A fé assinalava todas as suas obras, e Deus o considerava pela pureza de suas ações e liberalidade, e dele Se aproximou em palavra e Espírito.

O anjo visita Cornélio

Enquanto Cornélio estava orando, Deus lhe enviou um mensageiro celestial, que se lhe dirigiu pelo nome. O centurião ficou temeroso, contudo sabia que o anjo fora enviado por Deus para instruí-lo, e disse: “Que é Senhor? E o anjo lhe disse: As tuas orações e as tuas esmolas subiram para memória diante de Deus. Agora envia mensageiros a Jope, e manda chamar Simão, que tem por sobrenome Pedro. Ele está hospedado com Simão, o curtidor, cuja residência está situada à beira-mar.”

Aqui, outra vez, Deus mostra Sua consideração pelo ministério do evangelho e por Sua igreja organizada. Seu anjo não seria aquele que contaria a Cornélio a história da cruz. Um homem, sujeito às fraquezas humanas e tentações como ele próprio, devia instruí-lo quanto ao crucificado, ressurreto e assunto Salvador. O mensageiro celestial foi enviado com o expresso propósito de colocar Cornélio em associação com o ministro de Deus, que lhe ensinaria como ele e sua casa podiam ser salvos.

Cornélio alegremente obedeceu à mensagem, e despachou mensageiros imediatamente à procura de Pedro, de acordo com as instruções do anjo. As minúcias destas informações, nas quais se mencionava até a ocupação do homem de quem Pedro partilhava o lar, mostram que o Céu está bem informado da história e dos negócios dos homens em quaisquer condições de vida. Deus está familiarizado com a ocupação diária do humilde operário, bem como da do rei sobre o trono. A avareza, a crueldade, os crimes secretos e o egoísmo dos homens são dEle conhecidos, bem como os seus bons atos, a caridade, a liberalidade e a bondade. Nada é oculto de Deus.

A visão de Pedro

Imediatamente após esta entrevista com Cornélio veio o anjo a Pedro, que, enfraquecido e faminto devido à viagem, estava orando no terraço da casa. Enquanto orava foi-lhe mostrada uma visão, “então viu o céu aberto e descendo um objeto como se fosse um grande lençol, o qual era baixado à terra, pelas quatro pontas, contendo toda sorte de quadrúpedes, répteis da terra, e aves do céu.

“E ouviu-se uma voz que se dirigia a ele: Levanta-te, Pedro; mata e come. Mas Pedro replicou: De modo nenhum, Senhor, porque jamais comi coisa alguma comum e imunda. Segunda vez a voz lhe falhou: Ao que Deus purificou não consideres comum. Sucedeu isto por três vezes e logo aquele objeto foi recolhido ao céu.”

Aqui nós podemos perceber a operação do plano de Deus para pôr a máquina em movimento, pela qual Sua vontade pode ser feita na Terra como é feita no Céu. Pedro não tinha ainda pregado o evangelho aos gentios. Muitos deles tinham sido interessados ouvintes das verdades que ele ensinava; porém, o muro de separação, que a morte de Cristo havia posto abaixo, ainda existia na mente dos apóstolos, e excluíam os gentios dos privilégios do evangelho. Os judeus gregos tinham recebido a obra dos apóstolos e muitos deles corresponderam àqueles esforços aceitando a fé em Jesus; mas a conversão de Cornélio ia ser a primeira de importância entre os gentios.

Pela visão do lençol e seu conteúdo, baixado do céu, Pedro devia ser despido de seu apegado preconceito contra os gentios; e entender que, mediante Cristo, todas as nações seriam participantes das bênçãos e privilégios dos judeus, e seriam assim igualmente beneficiadas como eles. Alguns têm afirmado que esta visão significa que Deus removeu Sua proibição do uso de carne de animais que foram primeiramente chamados imundos; e que por causa disso a carne de porco servia para alimento. Esta é uma interpretação estreita e totalmente errônea, e plenamente refutada no sentido escriturístico da visão e suas conseqüências.

A visão de toda sorte de animais vivos, contidos no lençol, e aos quais foi ordenado a Pedro matar e comer, sendo-lhe assegurado que o que Deus purificou não devia por ele ser chamado comum ou imundo, era simplesmente uma ilustração que apresentava a sua mente a posição real dos gentios — que pela morte de Cristo eles foram feitos co-herdeiros com o Israel de Deus. Isto serviu a Pedro tanto como reprovação como de instrução. Seu trabalho tinha até então se confinado inteiramente aos judeus; tinha ele olhado para os gentios como uma raça imunda, e excluída das promessas de Deus. Sua mente estava agora sendo levada a compreender o alcance mundial do plano de Deus.

Enquanto ponderava sobre a visão, esta lhe foi explicada. “Enquanto Pedro estava perplexo sobre qual seria o significado da visão, eis que os homens enviados da parte de Cornélio, tendo perguntado pela casa de Simão, pararam junto à porta; e, chamando, indagavam se estava ali hospedado Simão, por sobrenome Pedro. Enquanto meditava Pedro acerca da visão, disse-lhe o Espírito: Estão aí dois homens que te procuram; levanta-te, pois, desce e vai com eles nada duvidando, porque Eu os enviei.”

Para Pedro esta era uma ordem probante; mas ele não ousava agir de acordo com seus próprios sentimentos, e por isso desceu de seu aposento e recebeu os mensageiros enviados a ele por Cornélio. Estes comunicaram sua singular incumbência ao apóstolo, e de acordo com a instrução que ele recebera de Deus, acedeu acompanhá-los na manhã seguinte. Hospedou-os cortesmente naquela noite e de manhã partiu com eles para Cesaréia, acompanhado por seis de seus irmãos, que deviam ser testemunhas de tudo quanto iria dizer ou fazer enquanto estivesse visitando os gentios; pois sabia que seria chamado a dar contas de uma violação tão direta da fé e dos ensinos judaicos.

Passaram-se quase dois dias antes que a jornada tivesse terminado e Cornélio tivesse o feliz privilégio de abrir suas portas a um ministro do evangelho, que de acordo com o que Deu afirmara, devia ensinar-lhe e a sua casa como podiam salvar-se. Enquanto os mensageiros desempenhavam sua incumbência, o centurião já havia reunido tantos quantos fora possível de seus parentes, a fim de que eles, como ele próprio, pudessem ser instruídos na verdade. Quando Pedro chegou, um grande número estava reunido, esperando ansiosamente para ouvir suas palavras.

A visita a Cornélio

Entrando Pedro na casa do gentio, Cornélio não o saudou como a um visitante comum, mas como a alguém honrado pelo Céu, a ele enviado por Deus. É costume oriental curvar-se perante um príncipe ou qualquer alto dignitário, e curvarem-se as crianças perante seus pais, que são honrados com posições de confiança. Mas Cornélio, tomado de reverência pelo apóstolo enviado por Deus, caiu aos seus pés e o adorou.

Pedro foi presa de horror por este ato do centurião, e levantou-o, dizendo: “Ergue-te que eu também sou homem.” Começou a falar com ele de modo familiar, a fim de remover o senso de respeito e extrema reverência, com que o centurião o considerava.

Tivesse sido Pedro investido com a autoridade e posição concedidas a ele pela Igreja Católica Romana, teria estimulado, ao invés de reprimir a veneração de Cornélio. Os assim chamados sucessores de Pedro requerem que reis e imperadores se curvem a seus pés, porém o próprio Pedro declarou ser apenas um homem falível, sujeito a erro.

Pedro falou a Cornélio e aos que estavam reunidos em sua casa, concernente ao costume dos judeus; que lhes era considerado ilícito misturarem-se socialmente com os gentios, pois implicava em contaminação cerimonial. Isto não era proibido pela lei de Deus, mas a tradição dos homens havia feito disso um costume obrigatório. Disse ele: “Vós bem sabeis que é proibido a um judeu ajuntar-se ou mesmo aproximar-se a alguém de outra raça; mas Deus me demonstrou que a nenhum homem considerasse comum ou imundo; por isso, uma vez chamado, vim sem vacilar. Pergunto, pois, por que razão me mandastes chamar?”

Imediatamente Cornélio relatou sua experiência, e as palavras do anjo que lhe havia aparecido em visão. Concluindo, disse: “Portanto, sem demora, mandei chamar-te, e fizeste bem em vir. Agora, pois, estamos todos aqui, na presença de Deus, prontos para ouvir tudo o que te foi ordenado da parte do Senhor. Então falou Pedro, dizendo: Reconheço por verdade que Deus não faz acepção de pessoas; pelo contrário, em qualquer nação, aquele que O teme e faz o que é justo Lhe é aceitável.” Embora Deus tivesse favorecido os judeus sobre todas as outras nações, ainda assim, rejeitando a luz e não vivendo segundo sua profissão, não seriam mais exaltados em Sua estima do que as demais nações. Aqueles que, entre os gentios, à semelhança de Cornélio, temessem a Deus e operassem a justiça, vivendo segundo a luz que lhes foi concedida, seriam bondosamente considerados por Deus, e suas sinceras práticas seriam aceitas.

Contudo a fé e a justiça de Cornélio não seriam perfeitas sem o conhecimento de Cristo; por isso Deus lhe enviou luz e conhecimento para posterior desenvolvimento de seu justo caráter. Muitos recusam receber a luz que a providência de Deus lhes envia, e como desculpa por assim fazer, citam as palavras de Pedro a Cornélio e seus amigos: “Pelo contrário, em qualquer nação, aquele que O teme e faz o que é justo Lhe é aceitável.” Sustentam que não tem importância o que os homens creiam, uma vez que suas obras são boas. Tais pessoas estão enganadas; a fé e as obras devem estar unidas. Eles devem progredir com a luz que lhes é dada. Se Deus os coloca em associação com Seus servos que receberam nova verdade, confirmada pela Palavra de Deus, devem aceitá-la com alegria. A verdade é progressiva e ascendente. Por outro lado, os que clamam que apenas sua fé pode salvá-los estão confiando em um vínculo frágil, pois a fé é robustecida e tornada perfeita somente pelas obras.

Os gentios recebem o Espírito Santo

Pedro anunciou Jesus ao grupo de atentos ouvintes; Sua vida, ministério, milagres, traição, crucifixão, ressurreição e ascensão, e Seu trabalho no Céu, como Representante e Advogado do homem, intercedendo em favor dos pecadores. Enquanto o apóstolo falava seu coração foi inundado do Espírito da verdade de Deus, que anunciava ao povo. Seus ouvintes estavam atraídos pelos ensinos que ouviam, pois seus corações haviam sido preparados para receber a verdade. O apóstolo foi interrompido pela descida do Espírito Santo, como foi manifestado no Dia de Pentecostes. “E os fiéis que eram da circuncisão, que vieram com Pedro, admiraram-se, porque também sobre os gentios foi derramado o dom do Espírito Santo; pois os ouviam falando em línguas e engrandecendo a Deus. Então perguntou Pedro: Porventura pode alguém recusar a água, para que não sejam batizados estes que, assim como nós, receberam o Espírito Santo? E ordenou que fossem batizados em nome de Jesus Cristo. Então lhe pediram que permanecesse com eles por alguns dias.”

O derramamento do Espírito Santo sobre os gentios não foi o equivalente do batismo. Os passos requeridos na conversão, em todos os casos são, fé, arrependimento e batismo. Desse modo a verdadeira igreja cristã está unificada em um Senhor, uma fé e um batismo. Temperamentos diversos são modificados pela graça santificadora, e os mesmos princípios distintivos regulam a vida de todos. Pedro cedeu às súplicas dos crentes gentios, e permaneceu com eles por algum tempo, pregando a Jesus a todos os gentios das proximidades.

Quando os irmãos na Judéia ouviram que Pedro tinha pregado aos gentios, e que se havia encontrado com eles e comido em suas casas, ficaram surpresos e ofendidos por tão estranho procedimento de sua parte. Temiam que tal conduta, que lhes parecia presunçosa, tendesse a contradizer seus próprios ensinamentos. Tão logo Pedro os visitou, eles o receberam com severa censura, dizendo: “Entraste em casa de homens incircuncisos, e comeste com eles.”

Ampliada a visão da igreja

Então Pedro, polidamente, apresentou todo o assunto perante eles. Relatou sua experiência com respeito à visão, e alegou que isso o advertia a não mais observar a distinção cerimonial da circuncisão e incircuncisão, bem como a não considerar os gentios imundos, pois Deus não faz acepção de pessoas. Informou-lhes da ordem de Deus para ir aos gentios, a vinda dos mensageiros, sua viagem a Cesaréia, e o encontro com Cornélio e o grupo reunido em sua casa. Sua precaução foi manifestada a seus irmãos pelo fato de, embora ordenado por Deus para ir à casa de um gentio, ter tomado consigo seis dos discípulos então presentes, como testemunhas de tudo quanto dissesse ou fizesse ali. Tornou a contar a substância de sua entrevista com Cornélio, na qual este lhe contara a visão, pela qual foi instruído a enviar mensageiros a Jope a fim de trazer Pedro, para que este lhe dissesse as palavras, mediante as quais ele e toda sua casa pudessem ser salvos.

Relatou os eventos de seu primeiro encontro com os gentios, dizendo: “Quando, porém, comecei a falar, caiu o Espírito Santo sobre eles, como também sobre nós no princípio. Então me lembrei da palavra do Senhor, como disse: João, na verdade, batizou com água, mas vós sereis batizados com o Espírito Santo. Pois se Deus lhes concedeu o mesmo dom que a nós nos outorgou quando cremos no Senhor Jesus, quem era eu para que pudesse resistir a Deus?”

Os discípulos, ouvindo este relato, foram silenciados e se convenceram de que a conduta de Pedro estava em direto cumprimento ao plano de Deus, e que seus velhos preconceitos e exclusivismo deviam ser inteiramente destruídos pelo evangelho de Cristo. “E, ouvindo eles estas coisas, apaziguaram-se e glorificaram a Deus, dizendo: Logo, também aos gentios foi por Deus concedido o arre pendimento para vida.”